Novas fontes de receita
Em um cenário de intensa concorrência e margens apertadas, alguns supermercados têm buscado alternativas criativas para complementar sua receita e conquistar a fidelidade dos clientes. Além das vendas diárias de produtos, surgem cada vez mais estratégias que vão desde clubes de assinatura e restaurantes até marcas próprias e postos de gasolina anexos. Esses movimentos mostram um setor em plena transformação, onde o foco está em aumentar a presença e a oferta de experiências aos consumidores, além de criar formas de rentabilidade que vão muito além das compras semanais.
O economista carioca Roberto Kanter, professor universitário especialista em marketing, conta que essa é uma estratégia para extrair o máximo possível do valor vitalício do cliente (lifetime value). O cálculo do LTV leva em conta fatores como o valor médio das compras, a frequência de compra, o tempo de relacionamento e a taxa de retenção, permitindo ajustes que maximizem o valor de longo prazo que cada cliente pode gerar. “Há também o aproveitamento do cross-sell, que é a venda cruzada, incentivando os shoppers a consumir o máximo de produtos e serviços que você oferece. Quantos mais atrativos, mais rentável eles serão”, conta o fundador do Canal Vertical, plataforma focada em inovação no varejo.
Principais tendências
Se você tem uma área de vendas grande, pode destinar parte dela para farmácias, lancherias, pet shops, lavanderias. As grandes tendências hoje estão em venda de serviços e não de produtos. “Tenho visto também áreas centrais de supermercados transformadas em dark kitchens, cozinhas escuras que preparam refeições para entrega por aplicativos. Algumas redes preferem fazer parcerias e receber um valor fixo pelo aluguel do espaço, sem estar diretamente ligadas à operação. Outros preferem verticalizar. Não existe melhor ou pior. O que predomina é a cultura da empresa”, reforça Kanter.
Mas quais serviços adicionar? Pesquisa funciona menos do que o teste prático, avisa o consultor. Tem que ter indicadores e entender com clareza qual o seu investimento, o quanto você quer de retorno, definir seu prazo de maturação. “Se você tem uma rede de 30 lojas, não vai começar com as 30, vai começar em três e vai aumentando aos poucos, vai entendendo o perfil do seu cliente e qual o perfil do seu mercado. Nem todos são adequados a tais expansões com os mesmos serviços”, explica. Alguns serviços contribuem de forma significativa para a rentabilidade. Ainda que a margem seja relativamente pequena, como num posto de gasolina, o volume de clientes é grande, você atrai um tráfego grande, soluciona problemas distintos num local só. Para um atacarejo, o posto agregado é uma alternativa interessante.
Exemplos distintos
A Cencosud opera no Brasil desde 2007, por meio de diversas bandeiras varejistas em nove estados brasileiros. Além disso, tem negócio de serviços financeiros, um braço especializado em retail media, lojas de melhoramento do lar e shopping centers. O Grupo Carrefour oferece soluções financeiras, aluguéis de espaços para outros negócios e algumas de suas lojas têm postos de gasolina. A Cia. Zaffari administra os shoppings da marca Bourbon, Moinhos e CenterLar, tendo criado em 2018 a divisão Airaz com esse objetivo. O Grupo Pão de Açúcar é conhecido por suas marcas próprias de referência, como Taeq (utensílios domésticos e decoração) e Qualitá (alimentos, bebidas, itens de higiene e limpeza).
A UnidaSul, de Esteio, possui uma indústria de beneficiamento de grãos, farinhas, temperos e achocolatados é responsável por produzir parte dos itens das 10 marcas próprias do grupo, com destaque para as marcas CBS, Valore, Amigo Pet, Caldo Nobre, Caldo Grosso e SuperCau. A unidade fabril conta com maquinário de última geração, que garante aos 35 colaboradores melhor resultado dos produtos e maior eficiência na produção, que chega a 13 mil toneladas/ano. A SulBras é o braço logístico que apoia essas operações. Os produtos da CBS são vendidos por dezenas de redes supermercadistas no RS.
Diversificação como estratégia
À medida que as condições macroeconômicas turbulentas continuam a desequilibrar os consumidores e a reduzir a lucratividade dos varejistas, analistas da McKinsey & Company acreditam que uma estratégia enérgica de diversificação é exatamente o que o setor de supermercados precisa para garantir sua viabilidade futura.
Em um relatório divulgado no ano passado, a consultoria observou que os supermercados têm se expandido para categorias fora de seu núcleo histórico, buscando novas maneiras de obter produtos, entrando em serviços ao consumidor e até mesmo se posicionando como serviços B2B. A mídia de varejo se tornou uma importante fonte de receita alternativa para vários.
Nos Estados Unidos, os fluxos de receita alternativos adicionais incluem o envolvimento em serviços financeiros, logística, programas de associação e até mesmo iniciativas de estilo de vida como streaming digital ou viagens. O Walmart já oferece um serviço de entregas (Walmart GoLocal) no mesmo dia para livrarias e outras empresas online, enquanto a Kroger expandiu seus ingressos para incluir insights de dados do cliente, serviços financeiros e mídia de varejo.
“Os varejistas de alimentos têm um conjunto atraente de opções para expansão estratégica”, observou a empresa em seu relatório. “À medida que as pressões de margem persistem, eles devem identificar áreas de crescimento além do núcleo para construir um ecossistema mais amplo de serviços e ofertas que expandam a proposta de valor do consumidor, criem capacidades e melhorem o perfil financeiro do negócio.”
FONTES ALTERNATIVAS DE RECEITA
As oportunidades de engrossar a linha de receita do varejo alimentar também foram identificadas pela Bnex Rock, especializada em ciência do consumo. De acordo com a empresa, esses são os percentuais de crescimento que podem ser gerados a partir de novas receitas:
Serviços financeiros: 5% a 10%
Retail Media e trade marketing: 5% a 10%
CRM e rentabilização de clientes: 3% a 5%
Inteligência para a indústria: 3% a 5%
Novos serviços (saúde, viagens, etc.): 2% a 5%
Marketplace e parceria com terceiros: 5% a 10%